“Nada de novo no front” é um tapa na cara. É um livro que te sacode, que joga um balde de água na sua cara e grita “ei, isso aqui é a realidade da guerra!”
Li esse livro há mais de seis meses, mas não consegui me esquecer do processo de desumaninação de Erich, o personagem principal da história.
Não consigo me esquecer de como, aos poucos, ele descobre que todos foram enganados e que AQUILO, aquele cenário horroroso, marcado por gritos, desespero, medo e sangue; AQUILO, sem glamour, sem felicidade; AQUILO é a guerra.
Sinceramente, não sei como Erich Maria Remarque, o autor dessa obra, teve força – mental, emocional e psicológica – para transformar todo o horror, desespero e dor que ele experimentou como soldado durante a Primeira Guerra Mundial em um livro.
Sim, embora não seja uma autobiografia, “Nada de novo no front” é baseado em fatos reais, nas experiências do autor enquanto soldado alemão na Primeira Guerra.
Talvez essa tenha sido sua forma de lidar com os traumas dessa experiência.
Contar ao mundo o que aconteceu nas trincheiras.
Contar ao mundo como era a vida dos soldados.
Contar ao mundo como a guerra só serve para destruir famílias e sonhos de pessoas inocentes, enquanto os verdadeiros interessados no conflito estão bem protegidos e distantes de qualquer bomba.
Depois dessa leitura, fico ainda mais assustada quando vejo pesquisadores e cientistas afirmando que a Terceira Guerra Mundial já começou a ser desenhada, devido às mudanças geopolíticas, conflitos regionais e crises econômicas que estamos vivendo ou vamos viver.
O pior de tudo é ver pessoas jovens, especialmente homens, romantizando esses conflitos e se voluntariando para atuar como soldados. Gente, tem jovens saindo do Brasil para lutar na Guerra entre Ucrânia e Rússia! Dá para acreditar? Obviamente, alguns deles já morreram.
Ler esse livro me fez questionar se esses jovens realmente sabem como é a realidade da guerra, como é a vida infernal de um soldado e que a maioria deles NÃO VOLTA PARA CASA.
Enfim, precisa escrever tudo isso para deixar minha indignação registrada. Mas vamos ao que interessa: à resenha de “Nada de novo no front”.
Resumo de Nada de Novo no Front
Antes de escrever minhas percepções sobre essa leituras, acho importante fazer um breve resumo dessa história.
Nada de Novo no Front, de Erich Maria Remarque, é um clássico da literatura que retrata a brutalidade e os horrores da Primeira Guerra Mundial. O livro acompanha a história de Paul Bäumer, um jovem alemão de apenas de 18 anos que, influenciado pelo patriotismo de seu professor, se alista no exército com seus colegas de escola.
À medida que o protagonista e seus amigos enfrentam as realidades do campo de batalha, eles se deparam com a realidade cruel e dura da guerra. Essa realidade destrói suas ideias românticas sobre heroísmo e sobre o conflito. O dia a dia do confronto é brutal, marcado pelo fome, pelo medo e pela morte.
E o autor mostra isso magestralmente em sua obra.
Remarque expõe a desconexão entre os soldados e a sociedade civil, mostrando como a guerra transforma jovens cheios de vida em homens endurecidos, emocionalmente esgotados e alienados. A obra não foca em grandes estratégias militares ou batalhas épicas, mas nos detalhes cotidianos da sobrevivência, das amizades que surgem em meio ao caos e do impacto psicológico devastador que acompanha cada morte e cada dia no front.
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O que explica o sucesso desse livro?
O sucesso de “Nada de Novo no Front” pode ser atribuído à experiência pessoal de Erich Maria Remarque, à autenticidade com que ele narra os horrores da guerra e à universalidade dos temas tratados no livro.
Remarque viveu as trincheiras da Primeira Guerra Mundial, foi ferido três vezes e saiu do conflito profundamente traumatizado. Durante anos, lutou contra a insônia e os fantasmas da guerra, transformando essas memórias dolorosas em um romance visceral e honesto. Essa vivência direta confere à obra um realismo que ainda impacta leitores de diferentes épocas e contextos.
O enredo, centrado no jovem Paul Bäumer, revela o resultado devastador da guerra sobre a juventude, a perda da inocência e o absurdo dos conflitos armados. A jornada de Paul, um adolescente que abandona os estudos para lutar em nome de um suposto patriotismo, é universal em sua mensagem: a guerra não poupa ninguém e destrói tanto os indivíduos quanto os ideais que a sustentam.
Além disso, o livro foi lançado em 1929, em um período em que o mundo ainda estava lidando com as consequências da Primeira Guerra e se aproximando da Segunda.
Ele capturou um sentimento global de perplexidade e cansaço em relação aos conflitos. Por isso, sua recepção foi incrível, resultando em cerca de um milhão de cópias vendidas em menos de um ano na Alemanha e outro milhão no exterior, um marco impressionante para a época.
A obra também se tornou uma ferramenta de ensino importante. Após ser traduzida para 58 idiomas, ela passou a ser usada em escolas ao redor do mundo. Por isso, o livro é considerado uma referência para compreender a Primeira Guerra Mundial e seus horrores.
Cenas que me marcaram
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Uma das cenas que me marcaram foi quando os personagens recebem os uniformes que devem ser usados em campo. Depois de um tempo, eles descobrem que aquelas roupas haviam sido usadas por soldados que haviam morrido. Paul e seus amigos eram apenas os substitutos da vez.
Outra cena que me devastou foi quando Paul e seus companheiros precisaram se esconder embaixo dos caixões em um cemitério improvisado para se esconder de um bombardeio.
E como não lembrar de quando eles estão indo para a linha de frente da batalha e percebem que os superiores já estavam preparando os caixões antes mesmo do conflito começar? É como se já soubessem ou esperassem sua morte depois daquela batalha.
Outra cena que me marcou foi um momento nas trincheiras, em que Paul percebe um soldado mais novo entra em pânico, começa a vomitar e chorar no meio do campo de batalha, em meio a troca de tiros. Ele não tinha a menor condição emocional e psicológica de estar ali (aliás, será que alguém tinha?), e acabou sucumbindo ao desespero naquele momento.
Por falar em saúde mental, poderia citar outras dez cenas que mostram os efeitos do horror da guerra na saúde mental dos soldados.
Mas vou citar só mais uma: quando Paul percebe que um soldado desistiu daquele lugar. Ele simplesmente se levantou e andou sem proteção pelo campo de batalha, apenas esperando para ser morto.
Imagina o estado mental do ser humano para ele preferir morrer logo de uma vez? Isso comprova que a guerra é mesmo um inferno.
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Nada de novo no front mostra que a guerra é um inferno
Erich Maria Remarque mostra, com riqueza de detalhes e uma escrita envolvente, o que qualquer pessoa de bom senso apenas imagina: a guerra é um inferno!
Isso fica claro pela trajetória e dos relatos de Paul Bäumer ao longo de dois anos de guerra. As descrições vívidas das batalhas, com sangue e destruição, mostram que os soldados são tratados como meros números em uma contagem de mortos.
Para deixar isso ainda mais claro, Remarque utiliza detalhes sensoriais para transmitir o horror das batalhas: o som das explosões, o cheiro da morte, os pedaços de corpo, as infestações de piolho e a lama que se torna parte da vida dos soldados.
Além do sofrimento físico, “Nada de Novo no Front” explora as consequências psicológicas da guerra. Os personagens enfrentam uma alienação profunda, que os fazem se sentir desconectados não apenas de suas famílias, mas também de si mesmos.
Em uma das cenas dessa história, por exemplo, Paul retorna para casa durante uma breve licença. Durante esse período, ele percebe que não consegue mais se relacionar com aqueles que amava. Ele se tornou um estranho em seu próprio lar. Essa alienação é um reflexo do trauma vivido nas trincheiras, onde a luta pela sobrevivência se torna uma rotina insuportável.
E sabe o que é pior: Paul encontrou mais paz na morte do que em vida. Ele é morto a tiros enquanto pegava uma borboleta e virou mais um número nas estatísticas da guerra. Mas isso não é nada de novo no front.
Você precisa ler esse livro!
Repito: esse livro é um soco no estômago. Agora, entendo porque ele se tornou um dos principais representantes dos romances antiguerra. É impossível terminar essa leitura sem sentir medo, horror e aversão a qualquer tipo de conflito armado.
No fim, a leitura só reforçou o que eu já pensava: não existem vencedores em uma guerra. Existem pessoas mortas e famílias destruídas. Os verdadeiros culpados pela carnificina, pela destruição e pelos motivos do conflito quase sempre se livram de qualquer punição.
Apenas os inocentes sofrem.
Enfim, recomendo fortemente este livro a todos que buscam entender não apenas a história da Primeira Guerra Mundial, mas também sobre o comportamento humano em situações extremas.
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